terça-feira, 16 de agosto de 2011

O Livro dos Acórdãos, Usos e Costumes I

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Leia-se agora o «livro que há de servir de Título e Acórdãos deste Couto e Honra de Fralães para seu bom governo»:

Ordenou o Doutor Provedor desta comarca de Barcelos, na última conta que tomou neste Couto, que os Vereadores dele fizessem seus acórdãos para o bom governo dele, pena de dois mil réis de condenação cada vereador, por cuja razão João de Araújo, de S. Pedro do Monte, e Domingos Luís, de Viatodos, vereadores o presente ano, com o seu Procurador, João Carvalho, mandaram fazer o presente livro para os ditos acórdãos e usos e costumes que há neste dito Couto de Fralães, que são os capítulos que adiante se seguem.

Ilustração 4 A sala a que estas escadas dão acesso é ainda conhecida como Sala do Tribunal. Era sem dúvida aí que decorriam as sessões da Câmara e as audiências do Tribunal

Cap. 1º
Do Juiz, Vereadores e Procurador: eleição

Há neste couto de uso e costume muito antigo, em dia o primeiro de Janeiro da cada um ano, nas casas da Quinta do Paço do Senhor Donatário deste Couto de Fralães, juntarem-se todos os moradores deste dito couto dentro na sala grande do dito donatário, perante ele e juiz e vereadores e mais oficiais que acabaram o seu ano, entregando estes juiz e vereadores e procurador as varas ao dito donatário, o qual, depois de as receber em si, nomeia o juiz que mais capaz lhe parece a um dos ditos moradores e lhe dão juramento dos Santos Evangelhos em um livro deles, sob cargo do qual lhe encarrega faça bem a sua obrigação, e lhe entrega a sua vara. E:

Cap. 2º
De como se elegem Vereadores

E logo no mesmo acto nomeia o dito donatário dois Vereadores daqueles moradores que mais capazes lhe parece deste mesmo couto e um procurador e a todos três lhe entrega a cada sua vara, os quais depois de as receber tomam também o juramento da mão do novo juiz em o dito livro deles com a mesma recomendação devida para fazerem as suas obrigações, cada um na sua jurisdição, tanto o vereador mais velho como também o mais novo e o dito procurador.

Cap. 3º
Do Jurado

No mesmo acto, depois de feito o acima e atrás declarado, nomeia o jurado velho que serviu o ano passado a um daqueles moradores deste dito couto que melhor e mais lhe parece, que não tenha privilégio nem outra coisa que o isente, e este tal nomeado que não mostra coisa que o escuse também toma e recebe o juramento da mão do novo Juiz.

Ilustração 5 Documento do juiz do Couto de Fralães, onde por erro ou por qualquer razão que nos escapa o juiz António de Araújo Costa aparece como «juiz ordinário do cível, crime e órfãos».

E naquele tal dia, todos os moradores que faltam em ir assistir à dita eleição, os condena o dito donatário sequer em duzentos e quarenta réis a cada um que faltou ou naquilo que melhor lhes parece.
No dito dia que o dito donatário elege as ditas Justiças manda dar a todo aquele povo que ali se acha junto vinho e fogaças repartidas a todos, cujas pagam de regalia os moradores de Campesinhos.

Cap. 4º
Dos Quadrilheiros

De três em três anos, elege o juiz e vereadores, a mais votos dos mora­dores, a saber, dois Quadrilheiros neste dito couto, que sirvam três anos completos, os quais se vão carregar na câmara de Barcelos e dar conta dos casos crimes que neste dito couto acontecem.

Cap. 5º
Do Aferidor

É costume haver um aferidor neste couto, que aferem os pesos e medidas todos os anos que há no dito couto para medir pão, vinho e azeite e tudo o mais necessário, e disso toma a câmara deste couto conhecimento, se estão capazes ou não.

Cap. 6º
Das audiências

É costume o juiz a fazer as suas audiências de todo o cível e órfãos todos os sábados de cada semana, não sendo dias inferiais, assistindo nela o jurado que também serve de pregoeiro, o qual é obrigado a apregoar quando é necessário e varrer a Caza do Concelho e fechar e abrir a porta da dita caza nos ditos dias em que se fazem as audiências, e quando ele juiz quer que também os quadrilheiros assistam nas audiências os manda chamar pelo mesmo jurado, e, se lhe não obedecerem, os condena com forme lhes parece.

Ilustração 6 O primeiro capítulo do Livro dos Acórdãos

Cap. 7º
Das condenações

É costume antigo quando o procurador tem que requerer vir os vereadores, para com o mesmo juiz, fazer audiência, depois da que faz o juiz quando é justo, o procurador a requer para se condenarem aquelas pessoas que não guardam das propriedades ou testadas mal tapadas, para cujo efeito os mandam notificar para se ver condenar, cujas pessoas condenam, ele juiz e vereadores, naquilo que lhes parece justo.
E tendo o procurador notícia que qualquer lavrador leva qualquer qualidade de gado e bestas sebados às crastas das casas de Fralães, do donatário deste couto, por lhe fazerem dano, em tal caso é costume levar o procurador duzentos réis por cada cabeça, para a despesa do concelho, sendo primeiro os donos dos gados avisados uma vez antes de lhos levarem às ditas crastas, e por cada cabeça mais justo lhe parece.

Ilustração 7 Utensílios do Aferidor

Cap. 8º
(Das correições de Janeiro e Maio)

É costume muito antigo fazerem toda a justiça deste couto Juiz, Vereadores e Procurador, e mais oficiais com o escrivão. Fazerem duas correições todos juntos, cada uns em seu ano, a saber, uma em Janeiro e outra em o mês de Maio, ver caminhos e tapagens e vergas das veigas, como também as vendas, açougue e moendas, para que tudo esteja capaz e bem asseado; e não achando tudo como se deve fazer, os condenam naquilo que mais justo lhe parece, para o que, primeiro que os condenem, os mandam notificar para se verem condenar, com declaração que aqueles que trouxerem gados soltos nas veigas condenam a cada um em quinhentos réis por capítulos antigos.

Cap. 9º
De como os Vereadores servem de louvados

É costume os Vereadores assistirem aos inventários dom couto e servem de louvados para avaliarem os bens móveis e de raiz que se lhe derem à carga para a factura dos ditos inventários e para tudo o mais que no dito couto for necessário, pagando-lhe duzentos réis por cada dia, quando para semelhantes coisas os chamarem.

Cap. 10º
Das posturas

É costume antigo servirem os mesmos vereadores de almotacés e irem por os vinhos, azeite, bacalhau e carne no açougue e tavernas todas as vezes que o procurador os chamar para este efeito, de cujo trabalho não levam paga alguma, que é sua obrigação, assim por antiguidade e principalmente se governam pela postura de Barcelos.

Cap. 11º
Da nova Justiça

É uso e costume muito antigo, assim que a nova justiça principiar a servir o seu ano, mandar notificar os vendeiros e marchante para fazerem os seus termos de obrigas, para estarem sortidos de tudo aquilo a que cada um deles se obrigar vender, e havendo queixa de que eles pelo decurso do tempo em que estão obrigados não estão sortidos ou vendem por demais das posturas, em tal caso é o procurador obrigado a tomar conhecimento do conteúdo e, achando ser assim, requerer ao juiz e vereadores façam audiência de câmara mandando o dito procurador por um oficial deste couto notificar aos acusados para se verem condenar, cujas condenações não têm quantia certa, mas sim naquilo que eles juiz e vereadores mais justo e acertado lhe parece, por não ter disso lei costume nem quantia certa.

Cap. 12º
Do Procurador

É costume o Procurador cobrar todas as condenações e delas dar a terça para sua Majestade, que Deus guarde, como também pagar todas as despesas do Concelho, tanto a caminheiros que trazem precatos como tudo o mais que for necessário para o Concelho, e sendo a despesa mais do que o rendimento, o pagam os procuradores de sua casa, como assim é uso e costume antigo neste dito couto, por não haver depósito no Concelho; e suposto até aqui não era de costume cobrar o procurador recibo dos caminheiros nas costas dos precatos e ordens, daqui em diante cobrará recibo daqueles a quem pagar, na forma do capítulo do dito Doutor Provedor, posto no Livro das Correições, folhas 58.

Cap. 13º
Da correição do Dr. Ouvidor

É de costume o Doutor Ouvidor da dita vila de Barcelos vir tirar residência em cada um ano das justiças deste couto, para cuja correição manda avisar a todo o povo deste couto para se acharem juntos no dia certo determinado no tal precato em que se faz ditas justiças e para dizerem se há ou não há queixas que dar das ditas justiças; e, feita a dita Correição deste tal ano, o procurador dele que neste tal ano serve neste dito couto, lhe paga a ele Doutor Ouvidor e a seus oficiais os seus salários, que costumam levar na forma do regimento.

Cap. 14º
Para donde se apela

É costume sentenciar o juiz deste couto toda a quantia cível com seu assessor, que será um letrado que cada um para isso procura donde lhe parece capaz, e dele se apela e agrava para o juízo da ouvidoria deste dito couto, que é o Senhor Donatário dele, do qual Donatário se apela também e agrava para a Relação da cidade do Porto.

E nesta forma declararam, ele dito juiz e vereadores que de presente servem neste dito couto, o presente ano, que estes são os usos e costumes que há neste dito couto, na forma que até ao presente se tem governado, os quais em virtude do dito capítulo no Livro das Correições, folha 58, declarado, mandaram escrever estes usos e costumes e assinaram com o Procurador e com o sobredito João Álvares da Silva, tabelião, neste dito Couto e presente tempo que de seu pedido os fiz e com eles assinei em raso:

João Álvares da Silva
Custódio Domingues, Juiz
João de Araújo, Vereador mais velho
Domingos Luís, Vereador mais novo

João Carvalho, Procurador

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